domingo, 6 de dezembro de 2009

Folião ou espectador?
Gustavo Dias

Era dia de carnaval , resolvi fazer diferente. Sempre fui folião, mas este ano não, seria um observador, um espectador das incríveis fantasias humanas. E lá vou eu, roupa clássica de verão para os dias de fevereiro no Rio de Janeiro: boné, camiseta, bermuda, chinelos e é claro uns trocadinhos para me refrescar em algum observatório, aquele boteco panorâmico, manja! Me mandei para o centro do Rio, Cinelândia. Planejei de ir sozinho, sem marcar com ninguém e nem ir para bar conhecido, para não correr o risco de acabar em um bloco, sabe como é, né ? O amigo bota pilha e lá estamos nós no meio da folia.

Disputei um cantinho numa birosca interessante, nesta época conseguir espaço no botequim não é fácil, mas me instalei próximo a uma bancada onde podia apoiar a minha gelada e observar os foliões que passavam pela rua.

Maravilhosa a criatividade dessa gente. Vê-se de tudo: lobo mau com chapeuzinho vermelho, menina de colegial agarrada com um bispo, saci com a cuca, pierrô e colombina, pierrô e pierrô... Bloco vai, cordão vem e de repente aparece na minha frente, um cara todo vestido de preto, com chapéu, capa e máscara preta. E não é que eu conhecia esse sujeito? Meu irmão quanto tempo!!! Exclamei ao vê-lo. Era um velho amigo de infância que resolvera se fantasiar de Zorro e falava em voz alta: “SOU O ZORRO, O CAVALEIRO SOLITÁRIO “. Contou que havia se separado do grande amor, que teria ido passar o carnaval na Bahia,e ele estava ali solitário e sem conseguir esquecer sua colombina. Falamos de nossas vidas, dos nossos amores, comentamos sobre os foliões que por ali passavam, isso tudo regado à cerveja e umas doses de pinga, para levantar o astral do amigo e brindar è claro esse encontro.

Lá pelas tantas meu velho amigo embriagado começou a chorar e falar que já não agüentava mais ser “O CAVALEIRO SOLITÁRIO” e que pegaria um avião para Salvador onde iria reencontrar seu verdadeiro amor. Tirou a fantasia e largou nas minhas mãos, entrou no primeiro táxi que passou e sumiu.

Fiquei por alguns instantes pensando na loucura que ele estava fazendo. Coloquei o chapéu preto na cabeça, pendurei a capa no ombro, botei a máscara no bolso da bermuda e pedi mais uma pinga. Bastou essa dose e não demorou muito, lá estava eu vestido de ZORRO, em plena Rio Branco desfilando no Cacique de Ramos, agarrado com uma bela índia... Eu era mais uma personagem nesta grande festa carioca.

Geraldinho Saudosista!
Orlando Professor
Geraldinho era um saudosista. O seu vocabulário era dos anos 50. Se referia as mulheres como “pequena”; quando uma coisa era certa, la vinha ele com a expressão: “é batata!”. Nas rodas de samba, Geraldinho era um bamba! Do seu 7 cordas só saia sambas antigos(dos anos 40 pra trás), falar em geração Cacique de Ramos perto do Geraldinho nem pensar. Era a pior das heresias. Na realidade nós, seus amigos, pedíamos a algum desavisado pra pedir que ele “tocasse alguma do Almir Guineto”, só pra ver o Geraldinho puto da vida. O pior é que ele nunca percebera que era sacanagem nossa.

No Carnaval, Geraldinho era um folião de primeira. Um ano saia de Diabo, no outro Zé Pereira com seu bumbo, no outro o cara saia de malandro ou pierrot....se infiltrava nos blocos, bandas e cordões....emendava um desfile no outro....haja fôlego!

O fato que vou relatar agora ocorreu no carnaval do longínquo 1988. A rapaziada estranhou que nos 4 dias dos festejos de Momo nem sombra do Geraldinho. O cara tomou um chá de sumiço. Na terça feira gorda eu e um grupo de amigos fomos até a casa de Geraldinho. Pensamos que ele estava acamado. Para nossa surpresa Geraldinho tinha saído de casa na sexta feira com um ar misterioso. Sua mãe pensava que ele estivesse na casa de um de nós...e como mãe é mãe, ficou sobressaltada. Tratamos de acalmar tia Sônia, minimizamos o acontecido dizendo que ele devia é de ta no bem bom com alguma pequena.

Saímos “meio que cabreiros”, pois o Geraldinho não era de aprontar essas coisas. Na quarta feira de cinzas encontramos o Geraldinho com cara de quarta feira de cinzas. Cobramos explicações a ele e a figura nos relatou um história fantástica: que tinha inventado uma máquina do tempo e que tinha se transportado pro carnaval do Século XIX, se juntou com uma galera do Morro da Conceição, Saiu no “Tira o Dedo do Pudim”, se apaixonou pela porta estandarte da agremiação mas ela era a mulher de um valente da Zona Portuária. Conheceu um tal de Prata Preta lá pelas bandas da Saúde, etc e tal.

Concluímos que o Geraldinho tava de gozação com a gente e demos-lhe um esporro federal e ele, injuriado, reafirmava tintin por tintin o que nos havia relatado. Começamos a pensar que o Geraldinho tinha pirado. Foi aí que alguém lembrou que aquele era o verão da lata...e como o geraldinho as vezes dava um tapa na pantera (numa linguagem do século XXI) as coisas começaram a fazer sentido.